'Virei professora para mudar a vida de crianças'




“Quando se quer algo, é preciso correr atrás, mas é preciso que se queira de verdade. Eu corri atrás daquilo que sonhava e acreditava.” Foi com esse pensamento que a professora Neusa Clementina Rosa Nunes, 70 anos, ou simplesmente professora Neusinha, conseguiu, por meio dos estudos, superar a morte dos pais e a infância em colégios internos para se tornar pró-reitora da faculdade onde estudou.

Os pais de Neusinha morreram quando ela tinha 8 anos de idade. Foi quando ela, que tem dois irmãos mais velhos, se mudou de Buritama para Araçatuba, onde morou em um colégio interno. “Foi um momento muito difícil, mas acredito que o amor entre mim e meus irmãos foi primordial para que superássemos isso. No colégio eu era a mascote da turma, pois, naquela época, não era comum ter crianças tão novas morando por lá”, conta.

Neusinha passou quase uma década em internatos de Araçatuba e outras cidades. Ela se recorda da rotina nestas instituições, que, segundo ela, contribuíram para aumentar o gosto pela leitura e estudos. “No período oposto às aulas, eu ficava lendo na sala de estudos. Era o que tinha para fazer, e eu adorava aqueles momentos”, diz.

LIVROS
Após anos no internato, Neusinha retornou para Araçatuba e foi morar com os tios e os irmãos. Apaixonada pela leitura, a futura professora dividia tempo com os livros e os afazeres domésticos que, segundo ela, eram uma preparação para a vida de casada. “Eu fui preparada para ser dona de casa e me casar. Meus tios não tinham uma cultura acadêmica e meu futuro, até então, seria o mesmo.”

Com uma infância sem luxos, Neusinha afirma que a criação recebida dos tios contribuiu para estar sempre em busca de ser a melhor, não importando a atividade que exercesse. “Lembro-me que eles diziam que eu deveria ser a melhor, se porventura me tornasse faxineira, eu teria que ser a melhor faxineira. Eu trago isso comigo até hoje.”



FACULDADE
Aos 26 anos de idade, casada e com dois filhos, Neusinha resolveu cursar uma faculdade. Ela pagou a taxa do vestibular com dinheiro emprestado pelo irmão. Por causa da lembrança de uma professora que teve na infância, ela começou a fazer o curso de ciências físicas e biológicas. “Ela era muito amorosa, muito dedicada, e eu queria ser como ela, acredito que minha paixão pela docência nasceu ainda na infância.”

Depois de trabalhar como bordadeira para conseguir complementar a renda e custear os estudos, Neusinha se forma, com quase 30 anos de idade, e começa a fazer o que, segundo ela, seria o maior presente de Deus em sua vida: dar aulas. “Foi a realização de um sonho, eu me tornei professora e poderia mudar, de alguma forma, a vida de crianças como a que eu fui.”

DEDICAÇÃO
No começo, Neusinha trabalhou como professora substituta em várias cidades da região, mas conseguiu passar em um concurso público e se tornou docente efetiva na rede estadual de ensino em Araçatuba.

O caminho na área de educação continuou sendo trilhado quando ela ingressou num curso de pedagogia, com o intuito de se tornar diretora de escola. “Tinha em mente que sendo diretora eu poderia ajudar ainda mais a melhorar a educação das crianças. E a pedagogia me daria suporte para isso”, explica.

Já graduada em pedagogia e com pós-graduações ligadas à área educacional, Neusinha se tornou vice-diretora, diretora escolar e, posteriormente, supervisora na Divisão Regional de Ensino em Araçatuba. Para entender as legislações referentes à educação, também cursou a faculdade de direito.

Após anos atuando no ensino público, Neusinha também lecionou no Unitoledo (Centro Universitário Toledo), onde concluiu sua primeira graduação, chegando, anos depois, à pró-reitoria. Hoje ela é empresária da área da educação e presta assessoria a instituições de ensino.



PREPARO
A professora Neusa Clementina Rosa Nunes afirma que há excelentes professores atuando, tanto na educação pública quanto particular. “Para ser professor é preciso estar preparado. É preciso conhecimento do todo para que o educador consiga se igualar ao aluno e transmitir esse conhecimento. Ninguém nasce pronto, ninguém sai da faculdade pronto, é preciso muito estudo e prática para ser um bom professor”, afirma.

A professora também diz que, para vencer na vida, é importante se relacionar com pessoas que proporcionem o crescimento. “Eu sempre tive em mente que eu precisaria andar, no mínimo, com pessoas iguais a mim. Quando se tem a sua volta pessoas com formação humana, você cresce enquanto pessoa. Isso também vale para a área profissional.”

Considerando a educação como a única forma de se “derrubar a ignorância e enxergar um futuro melhor”, Neusinha afirma, ainda, que o conhecimento nem sempre vem de pessoas com cultura acadêmica.

“O conhecimento está em diversas formas: tem gente que não tem estudo, mas é dotada de muito conhecimento e sabedoria, do mesmo jeito que tem gente com muito estudo e pouca sabedoria. Temos que valorizar a formação humana, acima de tudo”, diz.


Reportagem: Victor Ferreira
Fotos: Paulo Gonçalves
Edição: Sérgio Teixeira

Folha da Região

"Vitória pela Educação" é uma série desenvolvida pela Folha da Região, jornal de Araçatuba que circula em 40 cidades do Noroeste Paulista.

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